18.12.07

DUAS GRAMAS DE TEMPO


Há quinze dias que nunca tens tempo para estar comigo. Tempo. O que é isso do tempo? Eu não sei o que é o tempo. É algum postal com números às cores ilustrado que tu não tens para me dar? O que é não teres tempo? Tempo, não é algo material para tu teres para me dar. O teu dia tem as mesmas 24h que o meu. Portanto, eu não tenho mais tempo do que tu. Talvez tu dividas as tuas 24h a que tens direito por dia, mal divididas. E de certeza que no final do dia, mesmo antes de te deitares, arranjas uns minutos para dispensares numa mensagem escrita de “olá! Saudades! Beijo!” Mas não, não tens tempo. Então vou eu atrás de ti, arranjar-te o tempo. Não levo um relógio especial – eu nem sequer uso relógio – nem um calendário, nem agenda. Vou simplesmente a tua casa, olhar para ti. Tenho saudades tuas. Sabes o que é? E isso não é algo que se mede como o tempo, mas algo que com o passar do tempo, aumenta. Hoje vou ver-te. Toco à campainha. Não atendes. Meto a chave na porta mas está torta, não entra. Uma porta pode ser um grande obstáculo, quando temos uma chave na mão que não roda e que impede de te ver, de matar as saudades, matar o tempo perdido. Abre a porta, vamos matar o tempo. Vamos matá-lo para que ele deixe de existir, e assim já não tens a desculpa de dizer que não o tens, porque ele não existirá. Coloco o dedo na campainha e deixo-o ficar. Não sei quanto tempo. Abres-me a porta. Estavas a dormir. Fazemos amor no sofá preto da sala. Dizes-me que é melhor darmos um tempo. Agora não entendo. Se tu não tens tempo, como é que de repente queres dar tempo? Como é que me vais dar algo que não tens? O que é isso de dar um tempo? Eu tenho-te dado todo o tempo que tenho. O tempo útil e o tempo de espera. O meu tempo é o teu tempo. E tu o que tens para me dar? Um tempo? O que significa um tempo? É uma nova expressão para me fazer ficar no meu sofá azul à espera que o telefone me diga que tem saudades minhas? Tu não me vais dar um tempo. Tu não me vais dar nada. Tu nem sequer tens nada para me dar, pois não? O tempo a que agora te referes é simplesmente o segundo passo assumido para o afastamento total dos nossos corpos, não é? Foi a última vez que fizemos amor, não foi? Não te pergunto nada disto. Aceito o tempo, e saio. Ou finjo que aceito. Olho a árvore Natal de Maio. Está assim porque ainda não tirámos fotografias com ela e com os nossos pais de natal de chocolate. Porque não tiveste tempo. Eu não quero que tu me dês tempo, ou um tempo, eu só quero que me abraces e que não digas nada. Abraça-me. E vais ver que no silêncio o tempo não existe. Antes de sair olho a tua cama. A minha fotografia que tentei que morasse ali, a olhar para ti a dormir, continua sem abrigo. Dizes que não queres que a tua empregada de limpeza saiba da tua vida pessoal, por isso a escondes no dia em que ela vem limpar. Curiosamente a semana tem 7 dias. Tens tanto tempo para a voltares a colocar no sítio. No meu sofá azul ainda ouço a tua voz que me explicas que continuamos namorados, e que continuas a gostar de mim, mas apenas estamos mais afastados. Então, qual é a diferença? Nos últimos quinze dias o único contacto que tive contigo foi “beijos” num sms. Qual é a diferença? Quem me dera encontrar uma caixinha azul cheia de tempo lá dentro para te oferecer. Uma semana depois vou a tua casa com o pretexto de ir buscar a minha toalha de praia. Recebes-me no escritório. Fechas a porta que dá para os quartos e vais tu buscar a toalha. Tenho a certeza que tens alguém em casa. Olho o chão do escritório inundado por sacos e malas. Vais mudar de casa? Não, é a minha sobrinha, vai aqui passar um tempo comigo a viver. E nós? Ah, é verdade! Nós demos um tempo. Não me beijas. Viras a cara. Cobarde. Sei que tens alguém dentro de casa e não assumes. Vou para a praia pensar sobre o tempo. Uma outra semana depois vou a tua casa. Meto a chave que me deste na porta mas por coincidência, ou não, nesse preciso momento estás a sair de casa. Fechas a porta atrás de ti e saímos. Conversamos no teu carro. Tenho saudades tuas. Está a passar tanto tempo. Dizes-me de novo que não, não terminámos o namoro. Digo-te que gosto muito de ti. Olhas-me nos olhos. Também gosto muito de ti. Era a última vez ía ouvia isto moldado pela tua voz. Perguntas-me se tenho dinheiro para o comboio. Saio. Não entendo a tua preocupação. Não entendo para perpetuas um pouco mais aquilo que sabes que é eu nunca mais te ver. Porque arrastas o tempo? Porque me mentes? Porque me dizes gosto de ti, se no fundo nem sequer me queres ver? Porque finjo que acredito em ti? Porque me calo com pena de mim? Porque não tomo uma atitude e desenho eu o fim? Porque perpetuo um pouco mais este sofrimento? É tudo uma questão de tempo. Não sei quanto tempo é que este tempo que tu queres dar tem. Mas eu espero. Já estou à espera há tanto tempo. Vou procurar a tal caixinha azul cheia de tempo. E se a encontrar posso telefonar-te? Sabes, eu ainda não sei o que é o tempo, mas lembro-me em criança de ouvir que o tempo perguntou ao tempo, quanto tempo o tempo tem, e que o tempo respondeu ao tempo, que o tempo tem tanto tempo, quanto tempo o tempo tem.

4 comentários:

Anónimo disse...

FELIZ NATAL! ^:)


abraço

Graduated Fool disse...

Um texto bonito, muito triste, dorido, mas bonito.

Alexandra Fernandes disse...

Provavelmente o melhor texto que li na minha vida. Adorei. Mesmo. Principalmente porque nesse texto vejo tantas ideias que muitas vezes tive mas que nunca juntei num só texto. Triste mas maravilhoso.
Beijinho.

PS: "roubei" a imagem da porta. afinal foi ela que me trouxe até aqui e me mostrou este texto maravilhoso. Penso que seja justo :)

Joana disse...

Desculpa-me por estar a cuscuvilhar o teu blog. Vim à procura do meu e, por acaso, dei com o teu. E...podias-me dizer como acabou essa historia?