7.9.06

HOROSCOPO DA SORTE




Eu sei que sempre fui uma pessoa que acredita que as coisas não são por acaso. Percebi desde cedo que havia um destino traçado para mim e eu havia de o descobrir. Uma vez pedi a uma cigana para me ler a sina. Disse-me que a minha linha da vida era muito curta e que eu ía morrer muito nova, ou de doença ou de acidente de carro. Gritei-lhe que ela devia era estar maluca e no fim ainda me rogou uma praga. A verdade é que desde aí vendi o carro e vou todas as semanas ao centro de saúde. O médico já desistiu de me perguntar “então de que é que se queixa?” porque eu nunca fui o género queixinhas e além disso o médico é ele. Ele é que tem a obrigação de adivinhar a minha doença. Se eu soubesse diagnosticar-me alguma coisa não me levantava às 7h da manhã para apanhar a consulta. Percebi que a medicina não serve para nada, além de nos fazer levantar cedo e decidi ler o horóscopo. Talvez o horóscopo desse alguma ajudinha à medicina. Um dia dei por mim a comprar todas as revistas e jornais semanais só para comparar o que me destinava sobre o meu signo do Zodíaco. Muitas vezes cheguei à conclusão que uns contradiziam os outros. E tentava perceber qual das predestinações para a minha sorte semanal era a minha preferida. Então elegia apenas uma e deitava o resto das revistas e jornais fora. E acreditava naquilo. Seguia fielmente todos os conselhos. Marcava consultas em médicos especialistas em rins quando na parte da saúde lia: “vigie os seus rins”. Cheguei a desconfiar do meu marido, e ler-lhe às escondidas as mensagens do telemóvel, e a ligar para o trabalho cada vez que chegava atrasado só porque tinha lido no horóscopo do signo dele: “no final desta semana, uma aventura amorosa pode surgir”. Mas a única coisa que surgia era o Alberto às 20h da noite, cheio de fome. Até que comecei a ficar seriamente preocupada quando um dia vi numa série de televisão eles a dizerem que escrever o Horóscopo numa revista era a tarefa menos simpática, e que sorteavam género roleta russa a quem cabia o sacrifício de semanalmente inventar bons conselhos e ditar a sorte para os doze signos do Zodíaco. Então deixei de acreditar nas revistas. E eu que acreditava mesmo que todas as pessoas nascidas em Novembro eram perigosas e muito sexuais porque eram “escorpião”, e as nascidas em Janeiro, muito calmas porque eram “aquário”. E que até certo ponto é verdade porque o meu Alberto é teimoso como um “touro”. Mas de facto como podia eu pensar que milhões e milhões de pessoas por esse mundo fora tinham exactamente as mesmas características, comportamentos e atitudes, só porque nasceram na mesma altura do mês. E que as pessoas todas eram iguais e se dividiam em doze categorias. E mais engraçado, é que comprava todas essas revistas como se tratassem de verdadeiros manuais de instruções do ser humano, género: “saiba como lidar com todas as pessoas nascidas entre 21 de Março e 21 de Abril de todo o mundo, seja qual for a idade, raça, credo, sexo e país de origem, em duas páginas.” Então percebi que não ia lá com horóscopos e decide-me a ir visitar um astrólogo. Isto depois de ter tentado imprimir o meu mapa astral da Internet e me ter deparado com uma folha cheia de riscos diagonais de todas as cores que eu realmente não entendia. Cheia de esperança que alguém me decifrasse aquilo, e me ditasse a minha sorte lá fui eu um dia de manhã. Ele explicou-me que via grandes mudanças lá para 2008, que eu tinha a lua em peixes, e que eu era uma pessoa que acreditava muito no destino. Ora essa última parte eu já sabia. Não precisava de ir pagar 50euros para ouvir isso. Também me disse não sei o quê do meu meio do céu, falou-me no meu descendente e no meu ascendente, e eu ascendi o mais rápido possível a rua até chegar ao metro agoniada a pensar que mais uma vez alguém não me tinha lido a minha sorte. E por azar a linha azul estava avariada e o metro nem se mexia. Então decidi ir a pé para casa. E por sorte a meio do caminho encontrei a minha irmã Conceição. Já não a via desde que saí lá da terra no dia do enterro da minha mãe. E já não falávamos desde esse malfadado dia por causa duma discussão que tivemos das partilhas da casa. Começámos a falar ali no meio da rua. E nunca mais deixámos de falar uma com a outra. E a meio do caminho percebi que podia ter ido no 31 ou ter apanhado um táxi, mas não. Fui a pé. E fui eu que escolhi. Ninguém me disse para ir a pé. Não estava escrito em nenhuma revista. E se não tivesse ido a pé, não tinha tido a sorte de ter encontrado a Conceição e até hoje não falávamos. Então percebi que quem faz a minha sorte sou eu. Quero lá saber se metade do céu é fogo ou ar, ou se meti a lua num aquário. Não sou obrigada a saber o que quer dizer “ter a lua em peixes” e o meu ascendente. Sei que tenho de dar comida aos peixes que estão lá em casa no aquário e que logo à noite a lua está no céu. E que amanhã quando acordar se Deus quiser há-de fazer sol, isto se não estiver a chover. Só tenho certezas disso e o resto não me importa. Vou viver um dia de cada vez e depois logo se vê. E vou eu tomar as minhas decisões e fazer a minha sorte. Porque a minha sorte faço-a eu. Mas às vezes ainda penso se foi por acaso que naquele dia o metro estava avariado.

1 comentário:

Nuno Gonçalo disse...

Gosto muito de acreditar nessas coisas. Apesar de ser difícil à vida. Parte da magia dela está em com a predistinação que nos foi dada tentar viver à nossa maneira... :D
Mas também tenho dias que penso que isso é uma grande palhaçada xD