16.7.09

A NOSSA REDE CORDELARANJA



Está um passarinho mesmo na minha janela a cantar. As janelas todas abertas. Uma luz irradiante dum sol que me sorri, entra pelo quarto. Ontem atei um lenço que comprei, à tua cabeça e disseste: “É assim que eu me imagino! Numa cabana, com um lenço!” Eu sei. E sonho com o dia em que possamos abandonar tudo isto e viajamos para essa praia. Não existirá nem tempo, nem horas e o mar será todo nosso. Acordamos de manhã e vemos o mar. Caminhamos à beira mar depois de eu ter feito sumo natural de laranja com maçã. Tu ensinas-me a nadar. Subo às árvores para apanhar um coco, eu que não gosto nem do cheiro do coco, mas tem de ser feito. E tu dizes com esse teu sorriso perfeito e esses olhos meigos que tu tens: “Pareces mesmo uma criança!” Pareço, e sou. E ao teu lado não tenho medo de o ser. Ao teu lado não tenho medo de nada. Nem da criança espontânea que salta aos gritos de dentro de mim, que se esquece de tudo em todo o lado, e que diz que tu estás com “gripe interna”, o que te faz rir desalmadamente. Sei que te divirto. Sei, porque tu me fazes feliz. E nessa cabana, onde tu me vais ensinar a gostar de comer peixe, deitamo-nos na rede cor de laranja, que eu ainda não consegui pendurar na nova casa, por ser demasiado pequena – o que é uma chatice pois logo eu que sempre quis ter uma rede – e adormecemos abraçados enquanto eu te canto uma canção de embalar. Pode não ser uma canção mesmo de embalar, pode até ser uma canção qualquer, escolhe tu, mas cantada ali na rede, contigo, será a mais perfeita canção de embalar. Porque o que o que dá sentido às coisas não são mesmo as coisas, mas o contexto que está à volta delas. E essa rede cor de laranja embala-nos num sono tranquilo. Eu vou deixar crescer os meus caracóis para tu dizeres “menino dos caracolinhos!” e vou oferecer-te muitas calças de linho branco. E nas árvores mesmo à volta da nossa cabana, muitos pássaros vão cantar. Vão cantar para nós. Vão cantar uma canção qualquer, qualquer que seja, não importa, porque cantada ali para nós, será uma canção perfeita numa magia paradisíaca nessa ilha de luz e cor. Não precisamos de nada, temo-nos um ao outro. Nem de cama vamos precisar, temos a nossa rede cor de laranja para dormirmos abraçados. E realmente não precisamos mesmo de muito espaço porque dormimos a noite toda colados e agarrados. Como almas gémeas. Como corpos que nunca se querem separar. Como duas crianças que caminham de mão-dada num jardim de malmequeres e amores-perfeitos e nunca querem largar as mãos. E hoje que olho esta janela pintada de uma luz que me enche o coração e me faz suspirar, penso que tenho de conseguir pendurar a rede, mesmo aqui no quarto, para podermos começar a sonhar com esses momentos na ilha o mais depressa possível. Pois acredito que quanto mais depressa sonhamos os momentos, mais rapidamente eles acontecem. E vou sonhar muitos momentos contigo. Porque me trazes paz. Quando comprei essa rede à três anos atrás, não sabia eu que era contigo que a queria dividir. Ou se calhar sabia, mas não sabia que sabia. Porque partilhar uma rede com alguém é partilhar o mundo, o amor, um pássaro que canta, ver o céu e as estrelas, sentir o embalar do vento, adormecer como numa cama de bebé, é voltar ao colo, é sorrir, é sentir paz, é ver o sol a entrar e a pintar tudo de uma luz mágica brilhante como se tudo tivesse sido pintalgado de purpurina e adquirisse o brilho das histórias de encantar. E todas as tardes e noites em que me balançava nessa outra casa, na rede, sentindo o vento fresco que vinha da varanda, sentia que um dia te ia encontrar. Vieste como esse passarinho veio cantar à minha janela. Entraste na minha vida, sorriste-me, fizeste-me sorrir, dás-me paz e alegria e sei que nunca mais te iras separar de mim. Porque o passarinho não está preso numa gaiola. Pode voar, voar por todo o lado, mas livremente volta sempre à minha janela. É essa a paz e a liberdade do nosso amor. É a liberdade do passarinho que aqui canta, sem prisões, sem obrigações, sem explicações, apenas o sonho de uma rede cor de laranja pendurada numa cabana de uma ilha regada por um mar imenso de harmonia. E quando sairmos daqui, sei que já aproveitamos o que daqui queríamos e poderemos partir. Tudo na hora certa. E nem sequer teremos que questionar essa hora, porque saberemos que é a hora certa. Existe uma hora certa para tudo. E essa hora não explica, sente-se. Tal como tu entraste na minha vida na hora certa, não vejo a hora de chegar a hora de pegar nessa rede cor de laranja e ir pendurá-la contigo nessa ilha. Achas que quando sairmos daqui em Setembro, voltamos? Ou talvez seja melhor continuarmos a sonhar abraçados juntos a ouvir este passarinho que nos canta à janela irradiada pela luz purpurinada do sol e esperarmos pela hora certa de partirmos para sermos livres, livres de tudo e sentirmos que voamos em paz e amor?


(ao meu chocolatinho)

escrito em 10.09.2006

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