7.9.06

DÁ-ME UM BÉBÉ



Sou filha única. O meu marido é filho único. A minha mãe antes de morrer era também ela filha única, assim como a minha sogra. O meu pai antes de morrer era também ele filho único, assim como o meu sogro. Parece que a nossa família não tem tido muito sucesso em perpetuar-se. E agora cabe-me a mim a glória de tentar gerar pelo menos um filho único. Estamos casados há cinco anos. Durante os primeiros três anos não pensámos muito no assunto. Estávamos a saborear a aventura de estarmos casados. No entanto agora é um assunto cada vez mais abordado à mesa de jantar. Começou por surgir entre a salada e o molho inglês, género: “ e se tivéssemos um filho?”, seguindo para “porque não temos um filho?”, e agora geralmente é “porque não me dás um filho?”. E tu não imaginas o quanto é difícil. Não imaginas o que sofre o útero de uma mulher, que se comprime, que se desgasta, que se rasga e se esforça para procriar e não consegue. O óvulo não quer descer. O óvulo não quer encontrar o espermatozóide. Não sei, parece que não o quer encontrar. E peço-lhe para que o encontre. Peço-lhe para que o encontre e se transformem os dois no bebé mais doce e mais sorridente. E tu nem consegues imaginar. Em vez disso, em vez de me apoiares, culpas-me de ser eu motivo pelo qual não corre uma criança pela sala e não sobe pelos sofás ingleses. Dizes: “és tu que não queres!” e eu quero. Eu quero muito. É o que mais quero. Quero ver esta barriga a crescer. Quero sentir vida dentro de mim. Quero olhar-me ao espelho e ver-me deformada. Quero entrar na Pré-mamã e comprar roupa para grávidas. Quero imaginar-lhe o rosto, o sorriso, a primeira palavra. Quero comprar-lhe sapatinhos amorosos de lã. Quero comprar um urso igual ao meu. Quero passear na rua e que me perguntem: “está de quantos meses?” ou “ é menino ou menina? “ ou ainda “ já tem nome?”. E sim, quero encontrar-lhe um nome. Quero nomear uma criança. Quero vê-lo a sair de dentro de mim a chorar. Olhar para ele e dizer: “chamaste...”. Mas não sei como te chamas. Ou se alguma vez te vou chamar alguma coisa. Mas tu não percebes. E vivo nesta ansiedade, neste nervosismo e culpa de não te conseguir dar um filho. Mas eu nem a mim me consigo dar um filho. E quero dar-me esse filho. Quero dar um bebé. Quero ter um bebé. Quero ver nascer. Quero fazer nascer. Nem que seja filho único como nós. Mas agora é a tua mãe que também não só não ajuda, como também me alimenta este horrível sentimento de culpa. “Já todos os vossos amigos têm filhos, menos vocês!”. Será que ela não percebe que ao dizer-me isso está cada vez mais a afastar de mim a hipótese de lhe dar um neto? E vivo nesta angústia e culpa de não lhe dar um neto. E a mim, quem me dá um filho? Tu, a tua mãe e todos vocês me pressionam para eu vos dar um bebé, e a mim, que me dá o meu bebé? Não se deve fazer sentir culpada por não estar grávida, uma mulher que deseja engravidar. E nessa culpa, nessa ansiedade e pressão sinto-me só. Sinto-me muito sozinha. Se pelo menos tu nascesses eu já não me sentiria só. Tinha-te a ti. Saías de mim. E sabia que existia algo de muito forte que nos unia. Sabia que essa nossa ligação seria perfeita, pois eu dar-te-ia a vida. E nunca me irias nem culpar ou pressionar. Irias amar-me incondicionalmente sabendo sempre que tudo o que eu fiz e todas as minhas escolhas foram por bem. E serias sangue do meu sangue. Carne da minha carne. E terias o meu sorriso e o meu brilho nos olhos. E a primeira palavra que dirias seria: “mãe!”. E penso em ti mãe, antes de morreres nunca me condenaste por nada, nem por qualquer escolha que eu pudesse ter feito. Sempre me amaste incondicionalmente. E eu era sangue da tua carne. E hoje, que não te tenho, sinto-me sozinha, no meio destes estranhos que não me compreendem. Quero fazer-te nascer para nunca mais me sentir sozinha. E quero amar-te como eu fui amada até a tua avó que nunca irás conhecer ter partido. Mas se tu chegares mesmo a nascer, um dia, não sei onde, não importa quando, mesmo que eu já nem consiga tomar conta de ti, promete-me que irás amar sem pressão, sem culpa, sem ansiedade, sem perguntas, apenas amar, prometes?

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